Crónica na Sé do Funchal


Estou sentado no meu banco preferido no interior da Sé do Funchal. Entre mim e Nossa Senhora de Fátima não existem mais lugares.

Daqui troco olhares com a altiva Nossa Senhora, que me sorri e me alcança com olhos meigos.

Tento retribuir, mas sei que tenho uma cara mais sisuda.

É um dos espaços da catedral mais concorridos e onde me sinto em paz. Os problemas ficam à porta e procuramos, em conjunto, soluções para as agruras da vida.

Sob a estátua está o único lugar onde se podem colocar velas, de verdade, em sua honra, e igualmente para pedir desejos ou pagar promessas.

Há também quem ponha uma moeda e acenda uma luz a simbolizar uma vela. Mas não é a mesma coisa. Nem de longe nem de perto. Vale pelo gesto, convenhamos.

Umas pessoas ajoelham-se, outras simplesmente ficam de pé a orar.

Junto a Nossa Senhora está uma fotografia do Papa João Paulo II, que já esteve nesta igreja, e a quem tive o privilégio de fotografar.

Também se encontra, à esquerda, um solidéu do Papa Francisco.

As pessoas continuam a passar entre mim e Nossa Senhora e a pararem.

Outras fotografam, focando na estátua.

Tirando uma criança que, desrespeitosamente, lá atrás, rompe o silêncio da igreja, há um decoro no espaço. 

Agora, o petiz está à frente e continua a fazer barulho. Os pais não se importam, mas deviam.

Este é o resultado de algum do nosso turismo que abrange distintas educações.

No entanto, a Sé é um monumento com muito para ver e contemplar, com relevância para os tetos mudéjares, que foram alvo, recentemente, de um grande restauro. Infelizmente, as luzes apagadas não permitem usufruir de tamanha beleza.

Continuo sentado no meu lugar neste banco de madeira que separa fiadas deles, sendo uma passagem entre as laterais e centro da igreja com chão em basalto.

Vejo e oiço uma senhora toda desengonçada, com os sapatos a anunciarem o seu andamento.

Tem uma carteira com a alça a atravessar o corpo na diagonal, puxando o casaco para cima, dando um mau aspeto.

Tem o cabelo lambido e a ponta de um guarda-chuva espetado, parecendo uma arma ao ombro. 

Parou para rezar a Nossa Senhora e colocar a moeda nas velas elétricas, mas esteve meia hora à procura dela na carteira.

Vai embora, sempre com o “umbrella” em riste.

Levanto-me, benzo-me e saio. Lá fora está uma chuva forte, contrastando com o dia solarengo que deixei à entrada.

Hesito se espero que passe ou se ignoro a água e vou para casa. Por impulso, decidi sair, sem correrias. Pelo caminho, a chuva foi perdendo intensidade, até que, quando cheguei a casa, parou.

Comentários

Mensagens populares